segunda-feira, 11 de novembro de 2013

O inconsciente real

O Inconsciente Real.
As manifestações das ruas brasileiras em junho de 2013.

Rosa Jeni Matz

As manifestações organizadas pelas redes sociais em junho em nosso país são efeitos do inconsciente real. A partir daí surgem singularidades e uma nova ordem social, apartidária, sem transferências, sem lideranças de um modelo paterno.
Pensando com Freud: em qualquer erupção do inconsciente emergem tanto pulsões de vida, de amor, Eros, que seriam os laços fraternos das manifestações, quanto pulsões de morte, algumas enlaçadas a Eros, onde o ódio, a agressividade a um poder instituído que violenta de modo econômico, ético e social o povo, aparece numa modalidade crítica, denunciativa, visando mudanças fundamentais. Mas, o ódio pode surgir de um modo destrutivo, solto, não-vinculado, como o vandalismo, o quebra-quebra, onde a capacidade de simbolizar fica submetida à ação imensa destrutiva de alguns homens.
Lacan, em seu ensino, desenvolve a questão do inconsciente em 2 momentos:
De início, retornando a Freud:
- o inconsciente freudiano, inconsciente simbólico, transferencial. Este é o inconsciente do drama edípico, da universalidade do Édipo, o inconsciente do recalque, o inconsciente como saber, do sujeito suposto saber, inconsciente que pede interpretação. O modo de gozo é fálico, atende às medidas, aos limites.
Já em seu último ensino, Lacan apresenta o inconsciente real, devido à mudança cultural onde o gozo impera como absoluto. A meu ver, estas manifestações das ruas, políticas, apontam para o inconsciente real, traumático, onde o traumático se fez aparecer. Ato de surpresa, sem sujeito, horizontal, várias tribos, sem sentido e interpretação. De uma imanência onde um significante transcendente surge: MPL, Movimento Passe Livre. Penso no passe lacaniano onde o sujeito analisando manifesta o seu desejo de ser psicanalista. A manifestação das ruas é um ato, de ruptura e responsabilidade, mas também em alguns momentos percebemos acting-out, e passagens ao ato. O sentido se desfez aparecendo o non-sense, sem sentido, que é o inconsciente real. Este inconsciente está além da interpretação, fora do sentido, sendo que a busca é pela redução do sentido, para tentar alcançar o real que nos escapa.


                                                                                                                 

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Pulsão em Lacan

Pulsão em Lacan
                                                                             Rosa Jeni Matz

Lacan com Freud diz que a pulsão é o conceito limite entre o psíquico e o somático, entre o simbólico e o real. A pulsão é representada no inconsciente pelos significantes, estruturado como uma linguagem, significantes que indicam as demandas do sujeito ao Outro, e as demandas do Outro ao sujeito, pelos modos de pulsão oral, anal... A pulsão é um mito, pois ao mitificar o real, narra a relação do sujeito com o objeto perdido. O significante ao barrar a necessidade produz a pulsão, que é o resultado da operação do significante sobre a necessidade, caindo um resto, algo que escapa, o desejo. No registro simbólico da pulsão, o sujeito dividido se encontra em conexão e disjunção com a demanda do Outro. No real o sujeito se torna seu objeto, é acéfalo, percorrendo o trajeto de ida e volta em torno do objeto.
Fórmula da pulsão: $◊D
O neurótico (sujeito barrado) identifica a falta do Outro com a demanda do Outro (D).
Em Posição do inconsciente, Congresso de Bonneval, texto dos Escritos de 1960/1964, Lacan afirma: “...o significante como tal, barrando por intenção primeira o sujeito, nele faz penetrar o sentido da morte.” A morte, como significante, da linguagem, simbólica, entra na “vida”, e vice-versa. Não há dualismo, a meu ver potência e ato. E, prossegue: “Por isso é que toda pulsão é virtualmente pulsão de morte”. Lacan quer dizer que o significante, a palavra mata a Coisa (Mãe como lugar do gozo incestuoso). O significante Nome-do Pai barra o gozo, a relação incestuosa mãe-criança, e a Coisa barrada dá origem ao objeto a, objeto perdido, causa do desejo, resto de gozo. E a atividade, denominada pulsão (trieb), tenta restaurar esta perda original, contornando o objeto.
A pulsão é uma montagem, surrealista, unindo o Outro e a sexualidade. Lacan segue Freud ao distinguir os 4 termos da pulsão: impulso (Drang), fonte (Quelle), objeto (Objekt) e alvo (Ziel). A Quelle é a zona erógena na pulsão. A atividade da pulsão, o seu circuito, se concentra no se fazer, como na pulsão escópica se fazer ver: uma flecha que contorna o objeto olhar e volta para o sujeito. A pulsão contorna um furo, velado pelas “imagens” da história do sujeito. Na pulsão, a estrutura de borda dada à zona erógena é assegurada pelo contorno que a pulsão faz em torno do objeto a.
Lacan cita o mito da lamela (lâmina), desenvolvido no Congresso de Bonneval e no seminário 11, Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. Ao romper as membranas do ovo (óvulo), de onde sai o feto, algo se volatiza, que é a lâmina, algo extrachato como uma ameba, e tem relação com o quê o ser sexuado perde na sexualidade, que se torna imortal. Este órgão é a libido, que é “puro instinto de vida” (pur instinct de vie), vida imortal. Observem que Lacan fala de “instinto de vida” e não pulsão de vida. É o que é subtraído ao ser vivo por ele se submeter ao ciclo da reprodução sexuada, sendo os objetos as suas figurações: seio, fezes, olhar e voz. A pulsão é parcial, envolve as zonas erógenas que são parciais. Toda pulsão é uma pulsão de morte, inexiste outra pulsão.
Se a pulsão no Seminário 11 aponta para uma ficção, em seu último ensino, no seminário 23, O sinthoma, Lacan indica que a pulsão é uma "fixão", a fixação do gozo do significante no corpo do sujeito:”...as pulsões são, no corpo, o eco do fato de que há um dizer". Prossegue: "é preciso que haja alguma coisa no significante que ressoe", e que para que esse dizer ressoe, "é preciso que o corpo lhe seja sensível". Neste último ensino, a pulsão de morte é o real pensado como impossível, “o fato de a morte não pode ser pensada é o fundamento do real”.

Bibliografia:
Lacan, J. Escritos. Seminários 11 e 23. RJ: Jorge Zahar Ed.
Quinet, A. A descoberta do inconsciente. RJ: Jorge Zahar Ed., 2000.
Brousse, Marie-Hélène. A pulsão I e II, in Para ler o seminário 11 de Lacan, org. Feldstein e outros. RJ: Jorge Zahar Ed., 1997.




                                                                                         

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Terra Firme - filme

Terra Firme, do diretor italiano Emanuele Crialese, filme franco-italiano.

                                                                                         Rosa Jeni Matz

Sempre gostei de filmes italianos embora não os tenha assistido muito atualmente. Gosto deles, pois mostram os costumes e a língua greco-romana, que também nos aproxima. E, além disso, a dimensão do trágico/do desejo/do gozo na vida e na morte está presente em sua cultura.
A ética é o fio condutor do filme. Lembrou-me a Antígona de Lacan, que luta pela lei dos deuses contra a lei da cidade de Creonte (seminário 7, a ética da psicanálise).
O avô de Filippo é a Antígona do filme, que segue a lei do seu desejo, de pescador, de nunca abandonar um ser humano no mar. A polícia, lei da cidade, confisca o seu barco, o impedindo de pescar, pois salvou alguns africanos em seu barco, ação proibida por lei, inclusive uma mulher grávida e seu filho que esconde em sua casa para não serem deportados. O avô, quase morre pelo seu desejo, ao salvá-los da morte no mar, dimensão trágica de Antígona.
A mãe de Filippo faz o parto, salvando mãe e filha, esta resultado de violência e abuso sexual sofrido pela mãe.
O jovem Filippo, ao se aproximar do sexo no mar, encontra a angústia. Surgem do mar, avançando em sua direção, africanos sedentos de braços amigos (terra firme). Não sabendo como lidar, Filippo não permite que entrem no barco, agindo com violência sobre as mãos dos africanos. Enquanto as mãos de sua mãe dão vida a uma menina africana, surgindo a bela frase no filme dita pela africana à mãe de Fillipo, mais ou menos assim: “minha filha para de chorar, pois sente o cheiro de suas mãos, que foram as primeiras em sua vida”. Já Filippo não consegue dar as mãos aos africanos. Um jovem esmagado pela angústia entre a demanda do avô e a demanda da polícia. Em tempo posterior, resolve esta angústia pelo ato. Traz para si a responsabilidade.
A ilha de Lampedusa está aí. Milhares de negros que lutam pela imigração, frutos da pobreza. Não podemos fechar os olhos. Todos nós somos responsáveis. Tudo isso é triste e vergonhoso!
O filme trata da dignidade humana.

quinta-feira, 30 de maio de 2013

Imaginário, Simbólico, Real, Autre

          Quatro conceitos em Lacan: Imaginário, Simbólico, Real e Autre (Outro).
                                                                                            Rosa Jeni Matz
 
Lacan explicita o campo psicanalítico através de 3 registros: Imaginário, Simbólico e Real, registros essenciais da realidade humana (réalité humaine).

Imaginário.

Modalidades do Imaginário. 
- No estádio especular se funda a relação narcisista entre a criança e a mãe, relação dual estruturada pela imagem do semelhante (semelhante = outro, autre), constituindo o eu (moi) da criança através de uma identificação imaginária com a mãe (eu-ideal), que se torna uma “unidade” ilusória de seu corpo, gestalt ilusória, pois o sistema motor e o sistema nervoso do infans (que ainda não fala) não se encontram desenvolvidos, devido a prematuração específica do nascimento no homem. A criança sai do momento do corpo despedaçado. O espelho funciona como Autre (Outro), pois se espera que a mãe ao entrar nesta relação com a criança já seja cortada anteriormente pela linguagem (Simbólico), senão acarreta casos de psicose.
- É o registro das imagens, da ilusão, do engano, da fascinação, da captação da imagem que determina a submissão da criança ao olhar do outro, captação imaginária do duplo, e do transitivismo entre as crianças colocadas uma frente à outra (a criança que bate diz que apanha), da confusão entre si e o outro, da agressividade.

Simbólico

      O registro do Simbólico baseia-se em descobertas da antropologia estrutural e da lingüística. O simbolismo social, cultural e lingüístico impõe-se como ordens anteriores, já constituídas para o infans, que será modelado segundo as estruturas destas ordens. A entrada da criança na ordem simbólica será pelo Édipo (os três momentos do Édipo em Lacan, sendo que no terceiro momento se dá o acesso da criança ao simbólico através da metáfora paterna, sustentada pelo recalque originário, que é estruturante, simbolização primordial da lei, metaforização efetuada através da substituição do significante do desejo da mãe pelo significante Nome-do-Pai), e pelas estruturas da linguagem.
“O inconsciente é estruturado como uma linguagem”, sendo o recalcado constituído por significantes que se organizam numa rede de combinações metafóricas e metonímicas (influências de Saussure e Jakobson). O sujeito é efeito da cadeia de significantes inconsciente.
O interdito do incesto (Lei) organiza a entrada da criança no social. A lei instaura as relações mediatas, por meio do símbolo, passando a criança de uma relação imediata com a mãe para uma relação mediata, graças à instauração da ordem simbólica pela entrada do pai, Nome-do-Pai, instituindo a falta pela castração.

Modalidades do Simbólico.
- o reconhecimento do sujeito, da palavra (plena), do ato, da responsabilidade, da verdade (meia-verdade), do saber, do desejo em relação à lei, se dá neste espaço/tempo de ordenamento simbólico.

Real

Campo propriamente lacaniano, discernido pela modalidade lógica do impossível, não cessando de não se escrever, ex-sistindo a imaginarização e à simbolização.

      Modalidades do Real.
- O real escapa à simbolização, se situando à margem da linguagem, embora tentamos apreender pedaços do real por intermédio do simbólico.
- O real é sem lei, não tem ordem, sem fendas. Pelo real aproximamos à categoria do gozo, que aponta para o excesso, tensão que ultrapassa um limite, e ao objeto a. O objeto a apresenta uma face como objeto causa de desejo, e outra face como resto, mais-gozar, que não é simbolizável, sendo partes destacáveis do corpo: seio, fezes, olhar e voz.
- O estatuto da Coisa (das Ding), alguma coisa isolada da cadeia significante, e a repetição, uma coisa não pode ser substituída por outra por não poderem se tornar significantes.
- A impossibilidade da relação sexual (il n’y a pas de rapport sexuel) – Lacan não afirma que as pessoas não têm relações sexuais, mas como Freud, diz que só há libido masculina, logo não há no inconsciente significante de/para mulher, a mulher não existe, portanto impossibilidade de relação/razão (simbólica) entre os 2 sexos. Em termos de lógica simbólica e teoria dos conjuntos só os homens são circunscritos pela função fálica, sendo as mulheres não-todas nesta função.

Autre – A -Outro
- A Outra cena, é um lugar onde se situam os elementos significantes, marcando a determinação simbólica do sujeito, articulando o inconsciente: “O inconsciente é o discurso do Outro”, “o inconsciente é estruturado como uma linguagem”. São as relações significantes que obedecem às leis da linguagem, determinando a constituição do sujeito desde o nascimento.
-  Lugar do código, linguagem, lei.
- É do Autre que se trata na função da fala.
-  “O desejo do homem é o desejo do Outro”, onde o sujeito se pergunta “o que quer o Outro?”.
- Modalidades: lugar do tesouro dos significantes, como Pai e Mãe (primeiros Outros da linguagem), desejo do Outro, demanda do Outro, gozo do Outro, Deus, o inconsciente.
- Autre barrado – Outro como falta, incompleto estruturalmente.

Referências
Fink, B. O sujeito lacaniano. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998.
Lemaire, Anika. Jacques Lacan: uma introdução. Rio de Janeiro: Campus, 1979.
Lacan, J. Seminários 1,  5, 7, 11, 22, 23. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor.
Lacan, J. Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998.
Roudinesco, Elizabeth e Plon, Michel. Dicionário de psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998.
Vallejo, A. e Magalhães, L. Lacan: Operadores da Leitura. São Paulo: Ed. Perspectiva, 1991.   

domingo, 26 de maio de 2013

Questões sobre a clínica psicanalítica no final do século XX e início do século XXI

Questões sobre a clínica psicanalítica no final do século XX e início do século XXI
                                                                                                     Rosa Jeni Matz

Este trabalho é uma reflexão sobre a crise da clínica psicanalítica nos finais do século XX e no início do século XXI. Em nosso país, eficientes psicanalistas trabalham em seus consultórios, mas por que a demanda clínica diminuiu?
Podemos tentar responder a questão através da perspectiva econômica. O Brasil e todas as nações vivem um momento difícil. O dinheiro, a moeda é rara. O desemprego cresce nas manchetes dos jornais. A vida íntima é escrachada em programas de televisão, onde a moeda comanda. A psicanálise que era considerada elitista nos anos 1980, embora ocorresse o funcionamento de algumas clínicas sociais, se popularizou mais, atendendo a população através de clínicas sociais, convênios, cooperativas, e até nos consultórios particulares o preço da consulta, muitas vezes, diminuiu pela baixa demanda. Mas será que o problema econômico atual é a causa da crise na clínica?
 Tem ocorrido uma inversão do privado e do público. Expor o privado não é mais uma questão de vergonha, humilhação, mas sim uma forma de se aproximar do poder. Na televisão, o privado se torna público, e sustenta a atenção do público. Gilles Deleuze, em Conversações, na entrevista Controle e Devir, afirma: “Talvez a fala, a comunicação estejam apodrecidas. Estão inteiramente penetradas pelo dinheiro: não por acidente mas por natureza. É preciso um desvio da fala. Criar foi sempre coisa distinta de comunicar”. Cita Primo Levi, que diz que os campos nazistas introduziram “a vergonha de ser um homem”. Os homens foram manchados pelo nazismo. Primo Levi chama de ”zona cinza”: “Vergonha por ter havido homens para serem nazistas, vergonha por não ter podido ou sabido impedi-lo, vergonha de ter feito concessões...” Acrescenta Deleuze: E quanto à vergonha de ser um homem, acontece de a experimentarmos também em circunstâncias simplesmente derrisórias: diante de uma vulgaridade grande demais no pensar, frente a um programa de variedades, face ao discurso de um ministro, diante de conversas de “bons vivants”.
 Podemos refletir sobre a banalização do pensar, como também a ausência do pensamento no mundo atual, no campo da comunicação, e em muitos programas de televisão. Pensamento como criação, criação de conceitos. O que encontramos são programas onde a intimidade sai do ambiente fechado, entrando no ambiente aberto, sem limites. Além da inversão do privado e do público, as fronteiras se dissipam. Estamos no mundo sem fronteiras. A arquitetura lança projetos onde as paredes desaparecem. O novo modelo de residência, o loft, inclui ambientes sem divisórias, onde a intimidade desaparece. O privado é olhado, controlado.
Gilles Deleuze afirma: “Estamos entrando nas sociedades de controle, que funcionam não mais por confinamento, mas por controle contínuo e comunicação instantânea. Burroughs começou a análise dessa situação. Certamente não se deixou de falar da prisão, da escola, do hospital: essas instituições estão em crise. Mas se estão em crise, é precisamente em combates de retaguarda. O que está sendo implantado, às cegas, são novos tipos de sanções, de educação, de tratamento.
O consultório psicanalítico, ambiente de arquitetura fechada, com portas e paredes, com limites precisos, teria de ser também atingido por essa prática de poder, o controle. As suas paredes poderão ser demolidas? O edifício psicanalítico está sendo transformado, sem que muitos profissionais se dêem conta.    
Podemos, também, refletir sobre a psicanálise pelo viés da “moda” (senso comum). No dicionário Aurélio Buarque de Holanda Ferreira se encontra a moda definida como: “uso, hábito ou estilo geralmente aceito, variável no tempo, e resultante de determinado gosto, idéia, capricho e das interinfluências do meio: conceitos em moda, a moda parnasiana”. Nos anos 1970 e 1980, podemos perguntar se a psicanálise estava em moda? Com muita força havia o movimento hippie, a revolução cultural, a anti-psiquiatria e a psicanálise. Os consultórios eram procurados, a demanda era farta, o apogeu. Para muitos a psicanálise estava em moda. Mas será que podemos associa-la à moda? Seria a psicanálise um “uso, hábito ou estilo”? Para os que a utilizaram como uso ela estava em moda. Numa sociedade capitalista, onde a própria invenção humana, a sua criatividade se torna um bem de consumo, um gadget, que depois de um tempo é jogado fora, como uma roupa que não está mais na moda, a clínica pode ter sido utilizada como um bem durável, como um meio de atingir a felicidade, que ao atingi-la ou não atingi-la, seria descartado após o seu uso.
Não é, também, pelo hábito que ela pode ser discutida, já que, figuradamente, como aparência exterior, aparece no mesmo dicionário a expressão “o hábito não faz o monge”, que Lacan revoluciona ao afirmar que “o hábito faz o monge”. A questão do estilo é muito vasta. Estilo é definido, no dicionário, como modo de escrever, de exprimir os pensamentos (entre outras definições). Podemos pensar em estilo psicanalítico? Esta é uma questão. “Freud explica?”, como expressão popular estaria relacionada ao estilo psicanalítico e/ou desejo?
Gilles Deleuze, em Diálogos, diz que os devires “são atos que só podem estar contidos em uma vida e expressos em um estilo”. Tanto os estilos, como os modos de vida não são construções. “No estilo não são as palavras que contam, nem as frases, nem os ritmos e as figuras... Gostaria de dizer o que é um estilo. É a propriedade daqueles dos quais habitualmente se diz “eles não têm estilo...”. Não é uma estrutura significante, nem uma organização refletida, nem uma inspiração espontânea, nem uma orquestração, nem uma musiquinha. É um agenciamento, um agenciamento de enunciação. Conseguir gaguejar em sua própria língua é isso um estilo... ser gago da própria linguagem. Ser como um estrangeiro em sua própria língua”.
Podemos pensar em Freud como um estrangeiro em sua língua alemã. Um estrangeiro, o estranho (unheimlich) no sentido do que lhe era mais familiar (heimlich). Consideramo-lo um grande escritor. A sua obra revolucionária gerou estranheza no meio intelectual de sua época. A expressão “Freud explica” aponta para uma estranheza, um desconhecimento na língua. Algo precisa ser explicado, algo escapa, há uma falta, daí a sua relação com o desejo.  
Psicanálise não é moda. Ela se torna moda quando é usada e abusada. Esta não é sua finalidade. Mas, constantemente ouvimos afirmações como: “A psicanálise saiu de moda”. Como tentar explicar este momento? Como sair desta indagação? Em várias revistas e jornais encontramos entrevistas em que os entrevistadores questionam aos entrevistados (psicanalistas, historiadores da psicanálise, etc) se a psicanálise terminou, se a morte da psicanálise se aproxima.
 Hoje, as academias de ginásticas estão lotadas. O corpo malhado é a grande meta, o bem supremo. A aparência jovem, esbelta, musculosa comanda o espetáculo. A saúde, tanto física como mental, é adquirida através de exercícios físicos regulares. O corpo é a grande estrela. Bodypump, Spinner, e outras técnicas são utilizadas em academias como fornecedoras de uma idéia de um corpo perfeito, ideal. “Become Somebody”. Esta é uma propaganda ligada ao BodyPump. Tornar-se alguém, tornar-se pessoa? A famosa obra de Carl Rogers, Tornar-se Pessoa, hoje se banalizou nas academias. Hoje, tornar-se alguém ou ninguém é ter um corpo “sarado”, quer dizer musculoso.
                  Observamos uma mudança na sexualidade. A psicanálise tem como um dos seus fundamentos a sexualidade humana. O surgimento da AIDS trouxe transformações no comportamento humano, e principalmente na sua vida sexual. Atualmente morte e sexo estão fortemente associados. As pessoas diminuíram a sua atividade sexual, fazendo sexo por telefone, pela Internet. O grande momento da clínica psicanalítica vem junto a um movimento de liberdade sexual. As pessoas faziam sexo, experimentavam suas possibilidades. Podemos associar esta crise psicanalítica com a crise da libido atual. Esta energia está presa, deslocando a prática sexual para o sexo virtual. O discurso psicanalítico trata do sexo, o esvaziamento da clínica demonstra também o desinteresse atual pelo sexo, sendo o sexo deslocado para o virtual e o banal. Apesar de estarmos em outra direção do que a de Deleuze é importante cita-lo: “A psicanálise é exatamente uma masturbação, um narcisismo generalizado, organizado, codificado. A sexualidade não se deixa sublimar, nem fantasiar, o que a interessa está noutra parte, na vizinhança e na conjugação reais com outros fluxos, que a esgotam ou precipitam – tudo depende do momento, e do agenciamento”. Precisamos refletir sobre estes fluxos que esgotam ou precipitam a sexualidade e sua relação com a teoria e a técnica psicanalítica atual. Quais os fluxos que estariam esgotando a prática psicanalítica?        
                 Como pensar sobre a diminuição da demanda na clínica psicanalítica? Como se aproximar deste esvaziamento? Utilizarei a filosofia como “ferramenta” auxiliar a psicanálise, aproximando-me da seguinte reflexão de Deleuze nos Diálogos: “Quando se consegue traçar a linha, pode-se dizer é “filosofia”. Não que a filosofia seja uma disciplina última, uma raiz última que contivesse a verdade das outras, ao contrário. Muito menos uma sabedoria popular. É porque a filosofia nasce ou é produzida de fora pelo pintor, pelo músico, pelo escritor, a cada vez que a linha melódica leva o som, ou a pura linha traçada, a cor, ou a linha escrita, a voz articulada. Não há necessidade alguma de filosofia: ela é inevitavelmente produzida lá onde cada atividade faz brotar sua linha de desterritorialização. Sair da filosofia, fazer qualquer coisa para produzi-la de fora. Os filósofos sempre foram outra coisa, nasceram de outra coisa.”
                   Assim, este próprio trabalho produziu de fora a filosofia, já que traz uma voz, escrita articulada. A psicanálise, como atividade clínica, está fazendo brotar uma linha de desterritorialização. Ocorre um esvaziamento de um território para outro. A filosofia nasce de outra coisa. Este acontecimento, encontro do agenciamento psicanálise e do agenciamento filosofia, nas suas diferenças, estabelecem relações. Através destas relações, deste encontro, será desenvolvida esta reflexão.   
                   Hannah Arendt, filósofa e pensadora política, nascida na Alemanha em 1906, morrendo em 1975, deixou inacabada a obra A Vida do Espírito, dedicada ao pensamento, à vontade, e ao juízo. No volume 1, sobre o pensar, cita  que tanto a filosofia, a metafísica, a teologia  “caíram em descrédito”. Discute a afirmação de que Deus está morto: “Deus está morto” (Hegel e Nietzsche), não é que certamente esteja morto (“algo sobre o qual o nosso conhecimento é tão pequeno quanto o que temos sobre a existência de Deus (tão pequeno, de fato que mesmo a palavra “existência” está mal empregada), mas que a maneira pela qual Deus foi pensado durante milhares de anos não é mais convincente; se algo está morto, só pode ser o pensamento  tradicional sobre Deus. E algo semelhante vale também para o fim da filosofia metafísica: não que as velhas questões tão antigas quanto o próprio aparecimento do homem sobre a Terra tenham se tornado “sem sentido”, mas a maneira pela qual foram feitas e respondidas perdeu a razoabilidade”. Logo, alerta para as novas questões que surgem para o pensamento.
                 Estas “mortes modernas” foram acontecimentos com determinadas conseqüências históricas importantes. Descartes, o filósofo fundamental da Era Moderna, no estágio inicial desta era, trata cada assunto afirmando “como se ninguém o tivesse abordado antes de mim”. O mundo novo se descortinava. Através do ponto arquimediano um novo olhar é introduzido. O sujeito entra em cena. O mundo é o da subjetividade. Passamos a nos olhar e a olhar a tudo como seres universais. Ocorre uma mudança na maneira de representar o mundo. A compreensão do mundo através de um ponto remoto da Terra; uma recodificação do mundo em termos algébricos.
             A psicanálise surgiu no final do século passado. Freud revoluciona o pensamento ao introduzir o conceito de inconsciente. Não falamos em Séc. XVII, mas em Séc. XIX. A psicanálise que teve uma grande demanda nos anos 1970 e 1980 no Brasil, séc. XX, também como a metafísica e outros campos do saber, teria de viver a sua crise, já que é característica do capitalismo decodificar para depois recodificar. Teria que viver a sua “morte moderna”, ou melhor, pós-moderna. Este é o processo capitalista, construção e desconstrução. A noção de progresso surgiu como produto das descobertas científicas no Séc. XVII, criando uma conexão com o ilimitado, levando a necessidade de descobertas renovadas, de um “processo” de progresso. Seria uma nova ilusão de felicidade. Novas formas de conhecimento precisam surgir para que a visão capitalista de felicidade se mantenha. Agora, como H. Arendt afirma ao se referir a “morte” da metafísica, é possível que algumas respostas às questões psicanalíticas perderam o sentido, não invalidando estas questões. 
              Hoje, ocorre um descrédito de tudo que não é visível. Segundo H Arendt, a principal característica das atividades espirituais é a sua invisibilidade. Há uma grande dificuldade em abordar e percorrer o “domínio do invisível”, sendo que ela adverte sobre o perigo de se perder o passado e suas tradições. Podemos falar de uma crise dos ideais? Seria possível, como H. Arendt coloca, haver uma morte do invisível? Entre 1929, Moisés e o monoteísmo, e 1938, O mal-estar na cultura, Freud “terminou” a sua reflexão sobre o supereu, reunindo as reflexões já feitas em Totem e Tabu, fundamentando o assassínio do chefe da horda primitiva como a origem do supereu e do sentimento de culpa, estabelecendo uma relação entre agressividade e sentimento de culpa, e surgimento da linguagem e do pensamento.
             Podemos relacionar a crise da clínica, neste final de século, com a reflexão realizada por Hannah Arendt sobre a ausência de pensamento? Estaríamos convivendo com a banalidade do mal?
                    A. Green denomina de estados - limite uma variedade da clínica atual, que também podem ser considerados como estados limites de anasabilidade. J. Mc. Dougall denominou – os de anti – analisantes. O modelo destes casos – limite conduz a uma contradição entre angústia de separação e angústia de intrusão. Esta angústia, diz Green, parece não atingir a problemática do desejo, mas sim à formação do pensamento (Bion).
                   H. Arendt pergunta: “O que nos faz pensar?” Responde com Kant que seria pela “necessidade da razão, o impulso interno dessa faculdade para se realizar na especulação”. Kant distingue Vernunft (razão) e Verstand (intelecto) após descobrir o “escândalo da razão”, que seria que “o nosso espírito não é capaz de um conhecimento certo e verificável em relação a assuntos e questões sobre os quais, no entanto, ele  mesmo não se pode impedir de pensar”. São as “questões últimas”, que apenas o pensamento se ocupa: Deus, liberdade e imortalidade. A “necessidade urgente” da razão é mais que a busca de conhecimento, que caberia ao intelecto. Razão coincidiria com o pensar, e este com o significado; e o intelecto com o conhecimento, a cognição. Mas, Hannah Arendt comenta, que pela influência da metafísica, Kant permaneceu inconsciente com relação ao fato de que a necessidade humana de refletir acompanha quase tudo o que acontece ao homem, ora as coisas que conhece, e ora as que nunca poderá conhecer. Mas, por tê-la justificado unicamente em termos das questões últimas Kant não se deu conta que havia liberado a razão, portanto a habilidade de pensar. Afirmava, defensivamente, que havia achado necessário negar o conhecimento para abrir espaço para fé. Mas não abriu espaço para a fé, e sim para o pensamento, não “negou o conhecimento“, mas separou o conhecimento do pensamento.
                Sócrates, consciente de que lidava com invisíveis, utiliza uma metáfora para esclarecer a atividade de pensar, a metáfora do vento: “os ventos são eles mesmos invisíveis, mas o que eles fazem mostra-se a nós e, de certa maneira, sentimos quando eles se aproximam”. Em Antígona de Sófocles, encontramos a mesma metáfora: “pensamento rápido como o vento”.  Heidegger se refere ao “tufão do pensamento“. Descartes, em suas Meditações afirma: “Se duvido, penso”. Parte da máxima incerteza, do mundo sensível, do mundo dos sentidos, demolindo antigas opiniões, consideradas falsas, regidas por um malin génie, chegando a uma primeira certeza a respeito da própria subjetividade: ”penso”. Depois da dúvida chega-se a certeza do Cogito: “Penso, logo sou”.
              Lacan reflete sobre o sujeito da certeza, afirmando que a via de Freud é cartesiana, parte do fundamento do sujeito da certeza, mas o que “Descartes não sabia, a não ser que fosse o sujeito de uma certeza e rejeição de todo saber anterior – mas nós sabemos, graças a Freud, que o sujeito do inconsciente se manifesta, que isso pensa antes de entrar na certeza”. Esta é a grande revolução freudiana, o “pensamento” inconsciente. Como Lacan fala: “Tudo que anima, o de que fala toda enunciação, é desejo”. Para Lacan a hiância do inconsciente é “pré-ontológica”, o que é da ordem do inconsciente “é que ele não é nem ser nem não-ser, mas é algo de não-realizável“.
                Eros, no sentido grego é amor, e Sócrates se diz conhecedor do tema do amor onde Hannah Arendt afirma: “O amor, como Eros, é antes de tudo, uma falta; deseja o que não tem. Os homens amam a sabedoria e começam a filosofar porque não são sábios... Ao desejar o que não tem, o amor estabelece uma relação com o que não está presente... É porque a busca empreendida pelo pensamento é um tipo de amor desejante que os objetos do pensamento só podem ser coisas merecedoras de amor – beleza, sabedoria, justiça etc. O mal e a feiúra quase por definição estão excluídos da consideração do pensamento. Eles podem apresentar-se como deficiências, consistindo a feiúra na ausência da beleza e o mal, kakia, na ausência de bem”. Para Sócrates o pensamento dissolve conceitos positivos até o significado original, o mesmo acontecendo com os negativos, até o nada. Logo, não acredita em mal voluntário, “o mal não tem estatuto ontológico: ele consiste em uma ausência, um algo que não é”. A relação entre o mal e a ausência de pensamento em Sócrates é “que as pessoas que não amam a beleza, a justiça e a sabedoria são incapazes de pensar, enquanto que reciprocamente, aqueles que amam a investigação, e assim “fazem filosofia” são incapazes de fazer o mal”.
                  Hannah Arendt, tomando como base esta reflexão socrática, aproxima-se da questão tão discutida da possível conexão entre a ausência de pensamento e o mal. Diz que Sócrates não pode ter acreditado que só poucos têm capacidade de pensar, nem que só alguns objetos de pensamento ofertam dignidade à atividade de pensar. “Se há algo no pensamento que possa impedir os homens de fazer o mal, esse algo deve ser uma propriedade inerente à própria atividade, independente dos seus objetos”. Sobre este assunto, no diálogo Górgias, onde o tema é a retórica (arte de dirigir e convencer as pessoas), Sócrates traz duas afirmações. A primeira é “melhor sofrer o mal do que o cometer“; e a segunda: ”Eu preferiria que minha lira ou um coro por mim dirigido desafinasse e produzisse ruído desarmônico, e [preferiria] que multidões de homens discordassem de mim do que eu, sendo um, viesse a entrar em desacordo comigo mesmo e a contradizer-me”. Apesar de Platão ter concluído o diálogo com um mito de além-mundo, onde reconhece o fato de que o homem voluntariamente comete atos maus, demonstrando a dificuldade destes filósofos de lidar com o problema do mal, Sócrates não está falando como cidadão comum, mas abordando a questão do pensamento. Sócrates se diz apaixonado pela sabedoria, respondendo a Cálicles que não o compreende, que diz primeiro que é melhor morrer do que ser escravo, pois sofrer o mal não é digno do homem (na Grécia se o indivíduo fosse a guerra e perdesse, era melhor morrer do que se tornar escravo do vitorioso); e segundo, que Sócrates estava “enlouquecido pela eloquência”.
                 Hannah Arendt afirma que Sócrates se diz um, logo não quer entrar em desacordo consigo mesmo, mas nada do que é Um, idêntico a si mesmo (A é A), pode estar em harmonia ou desarmonia consigo mesmo, “no mínimo dois tons sempre são necessários para produzir um som harmonioso. Certamente quando apareço e sou visto pelos outros, sou um; de outro modo seria irreconhecível... Chamamos de consciência (literalmente, “conhecer comigo mesmo”, como vimos) o fato curioso de que, em certo  sentido, eu também sou para mim mesmo, embora quase não apareça para mim – o que indica que “sendo  um” socrático não é tão pouco problemático  como parece; eu não sou apenas para os outros, mas também para mim mesmo; e, nesse último caso, claramente eu não sou apenas um. Uma diferença se instala na minha unicidade”.
                      Hannah Arendt afirma que Sócrates descobriu o “dois-em-um” como essência do pensamento, mas quando o pensador é chamado para o mundo das aparências, ele se torna Um, pois o processo de pensamento é interrompido, como se a dualidade em que tinha se dividido o pensamento retornasse à unidade. O pensamento, existencialmente falando, é um “estar-só“, não sendo solidão. “O estar-só é a situação que me faço companhia”. A solidão seria a incapacidade de se dividir em “dois-em-um”, como Jaspers afirmava: “eu falto a mim mesmo“. Os homens, para Hannah Arendt existem no plural. É a dualidade do eu consigo mesmo que torna o pensamento uma atividade onde eu mesmo pergunto e respondo.
                  Para Sócrates a dualidade do “dois–em-um” representava que para aquele que quer pensar é proveitoso que os parceiros do diálogo sejam “amigos”. “O parceiro que desperta... quando estamos alertas e sós, é o único do qual não podemos nos livrar - exceto parando de pensar. É melhor sofrer uma injustiça do que cometê-la; quem gostaria de ser amigo e ter que conviver com um assassino?” Hannah Arendt associa a afirmação socrática com o Imperativo Categórico de Kant: “subjacente ao imperativo “aja apenas segundo uma máxima tal que você  possa ao mesmo tempo querer que ela se torne uma lei universal” está a ordem: não se contradiga”. A lei básica do diálogo do pensamento é não se contradiga.
                   No diálogo Hípias Maior, Sócrates descreve esta situação ao se referir que em sua casa lhe espera um parente próximo, afirmando Hannah Arendt, que anos depois a este sujeito que lhe aguarda em casa foi dado o nome de “consciência moral”, que aparece como um repensar de opiniões não submetidas à análise: “O que faz um homem temê-la é a antecipação da presença de uma testemunha que o aguarda apenas se e quando ele volta para casa”. E, prossegue: “Não se trata aqui de perversidade ou bondade, como também não se trata de inteligência ou estupidez. Uma pessoa que não conhece essa interação silenciosa (na qual examinamos o que dizemos e fazemos) não se importa em contradizer-se, e isso significa que ela jamais quererá ou poderá prestar contas do que faz ou diz; nem se importará em cometer um crime, já que pode estar certa de esquecê-lo no momento seguinte”. Nem poderá começar “este diálogo isolado e sem som que chamamos de pensar...”.
               A psicanálise é "arte" com palavras, linguagem. O pensamento socrático traz importantes contribuições para a compreensão do discurso psicanalítico. No Banquete, de Platão, obra de leitura atenta realizada por Lacan, encontramos conceitos fundamentais como desejo e transferência. Hannah Arendt realiza uma leitura original do pensamento socrático sobre  pensar e ausência do pensar. Hoje, ocorre desinteresse para a ação do pensar. A diminuição da demanda à clínica psicanalítica se aproxima desta situação crescente mundial de ausência de pensamento, do encolhimento do simbólico, aparecendo a condição de solidão. Cada vez mais o homem se torna solitário: a solidão como incapacidade de dividir “dois-em-um”.                                                            
                                                                          
Bibliografia
Arendt, H.. A Vida do Espírito.  RJ: Relume Dumará, 1995.
Arendt H..  A Condição Humana. RJ: Forense Universitária, 1999.
Descartes, R.. Meditações. In Os pensadores. SP: Editora Nova Cultural, 1999.
Deleuze, G.. Conversações. SP: Editora 34, 1998.
Deleuze, G. e Parnet, C.. Diálogos. SP: Editora Escuta,1998.
Ferreira, A. B. H.. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. RJ: Editora Nova Fronteira.
Kaufmann P.. Dicionário Enciclopédico de Psicanálise. RJ: Jorge Zahar, 1996.
Lacan, J.. Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. RJ: Jorge Zahar, 1988.
Rogers, C. R.. Tornar–se Pessoa, Lisboa: Livraria Martins Fontes, 1973.                                                                                                                          


segunda-feira, 6 de maio de 2013

Hannah Arendt: a liberdade como raison d’être da política


Hannah Arendt: a liberdade como raison d’être da política.

Hannah Arendt em A condição humana[1] apresenta a ação como a atividade humana fundamental da vita activa, correspondente à condição humana da pluralidade, condição específica de toda vida política. Agir é iniciar, começar algo novo, imprevisível. A ação e o discurso são modos pelos quais os homens se manifestam uns aos outros, e se inserem no mundo. A ação, como início, é a efetivação da condição humana da natalidade, sendo que o discurso efetiva a condição humana da pluralidade, possibilitando a singularidade na pluralidade. Na ação e no discurso os homens surgem como quem são.
Na obra Entre o passado e o futuro[2], Hannah Arendt levanta a questão: “Que é a liberdade?”[3], pergunta de difícil compreensão. Afirma que Kant liberta a liberdade do duplo domínio da causalidade: a causalidade da motivação interna, campo da percepção interior, e do princípio causal que rege o mundo exterior, distinguindo uma razão teórica ou pura de uma razão prática, que apresenta como centro uma vontade livre: “o agente dotado de livre-arbítrio, que é na prática importantíssimo, jamais aparece no mundo fenomênico, quer no mundo exterior dos cinco sentidos, quer no campo da percepção interior mediante a qual eu percebo a mim mesmo”[4]. Mas, assinala que a tradição filosófica distorceu a idéia de liberdade, ao transpô-la do campo original da Política e dos problemas humanos gerais para o domínio da vontade. Dos filósofos pré-socráticos até Plotino, não há preocupação com a questão da liberdade, aparecendo pela primeira vez, através da experiência de conversão religiosa, inicialmente de Paulo, e depois de Santo Agostinho. Na Antigüidade grega e romana a liberdade era um conceito exclusivo da política, e se tornou um dos problemas principais da Filosofia, ao ser vivenciada como algo no relacionamento entre mim e mim mesmo, fora do relacionamento entre os homens. A liberdade tornou-se sinônimo de livre-arbítrio, sendo a sua presença vivenciada em solidão.
Para Hannah Arendt ao falarmos da liberdade precisamos ter em mente o problema da política e o fato de o homem ser dotado com o dom da ação, duas potencialidades contidas na relação com a liberdade. A liberdade é a razão de ser (raison d’être) da política, e o seu domínio de experiência é a ação. A liberdade política é o oposto da liberdade interior, que é um espaço íntimo onde os homens fogem da coerção externa, e sentem-se livres. Este sentir interior não se manifesta externamente, logo é sem significação política, a liberdade interior foi o efeito de uma retirada do mundo onde a liberdade foi negada. Este espaço interior não deve ser confundido com o coração ou a mente, que existem em relação com o mundo. A interioridade, como espaço de absoluta liberdade, foi descoberta na Antigüidade tardia por aqueles que não ocupavam lugar próprio no mundo, que careciam de uma condição mundana. Antes de se tornar um atributo do pensamento ou uma qualidade da vontade, a liberdade era compreendida como um estado do homem livre, que o tornava capaz de se mover, de sair para o mundo a fim de se encontrar com outros homens pelas palavras e ações. “Essa liberdade era precedida da liberação: para ser livre, o homem deve ter-se libertado das necessidades da vida”[5]. Mas, além da liberação, a liberdade necessitava da companhia de outros homens num mesmo estado, de um espaço público comum, um mundo politicamente organizado. Os filósofos começaram a se interessar pelo problema da liberdade quando ela não era mais vivida no agir e na associação com outros homens, mas no querer e no relacionamento com o próprio eu, quando se tornou livre-arbítrio. Devido ao desvio da ação para a força de vontade, torna-se soberania, independência dos outros e até prevalência sobre os mesmos. A identificação da liberdade com soberania conduz à negação da liberdade humana.
Ao pensar a palavra “agir”, Hannah Arendt diz que o termo grego árkhein abarca o começar, o conduzir, o governar, qualidades do homem livre, logo a liberdade era vivenciada na espontaneidade. Cita Santo Agostinho: “Para Santo Agostinho Deus criou o homem para introduzir a faculdade de começar: a liberdade”[6]. O homem é livre, pois o seu surgimento no mundo é equacionado ao aparecimento da liberdade no universo. O homem é livre ao ser um começo, e pode começar.
A liberdade, enquanto relacionada à política, não é considerada por Hannah Arendt como um fenômeno da vontade, mas sim da ação. Considera o milagre como a interrupção de uma série de acontecimentos, de um automatismo, pelo inesperado, sendo que os homens o realiza: “– homens que, por terem recebido o dúplice dom da liberdade e da ação, podem estabelecer uma realidade que lhes pertence de direito”[7].
Hannah Arendt alerta sobre a soberania, onde a vontade se torna poder, tornando-se um ideal de livre arbítrio, onde o individual egoísta e narcísico se torna dominante.

Notas
[1] Arendt H.. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999.
[2] Arendt H.. Entre o passado e o futuro. São Paulo: Perspectiva, 1997.
[3] Ibid., p. 188
[4] Ibid., p. 190
[5] Ibid., p.194
[6] Ibid., p. 216
[7] Ibid., p.220


Referências bibliográficas
Arendt H.. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999.
Arendt H.. Entre o passado e o futuro. São Paulo: Perspectiva, 1997.



quinta-feira, 18 de abril de 2013

A dor de existir

A dor de existir
Lacan extraiu do budismo a noção de "dor de existir", inserindo-a em sua obra. A dor de existir é conseqüência da existência do sujeito no campo da linguagem. É o seu destino. Para existir como sujeito o homem está condenado a se alienar, a "ex-sistir" fora de seu corpo, identificando-se ao significante que o define, dependendo do Outro simbólico, que preexiste ao sujeito. A dor de existir surge quando o prazer dá lugar à dor na vida do sujeito, o desejo não está mais presente, manifestando-se o castigo por ter desejado. É a morte mordendo a vida.



A dor de viver                                                                                          
                                                                                              
A dor e o existir...
A vida se inicia
Vem a dor
Vem o ardor

A dor faz parte da vida
O parto partilha a dor
Dor da mãe
Dor do filho
Dor do pai

O bebê chora
Dor?
A mãe chora?
Dor?
O pai chora
Dor?

Dor de amor
Dor de corpo
Dor de alma
Dor psíquica
Quanta dor!

Mas, o ardor?
A dor do ar, da respiração...
Do nascimento
Da ânsia, do fogo,
A dor da angústia
Da morte.

Arde o coração por paixão
Dói o coração por ódio
Nós, homens tentamos nos livrar da dor...
É tão difícil sentir dor
.
Dor dourada
Dor que dura
Dor de nós dois
Que buscamos a vida sem dor

Para viver no coletivo
Consentir a perda
Perda girando dor
Dança de dor

Dor de existir
A dor e o ex-sistir
Corpo de dor
Dor do “partir”.

segunda-feira, 1 de abril de 2013

Habermas e a psicanálise


Habermas e a  psicanálise: crítica ao dogmatismo

Heck afirma na introdução de Conhecimento e Interesse[1]que Habermas parte da tese de que “todo conhecimento é posto em movimento por interesses que o orientam, dirigem-no, comandam-no”[2], sendo que o único interesse que se legitima a si próprio é o da emancipação da espécie. Da identidade de tornar-se livre em um determinado momento e ser-livre algum dia resulta para Habermas uma concepção original de práxis. Trata-se de manter viva a teoria, o discurso isento de coerção, buscando pela reflexão a emancipação. Encontramos no livro elementos básicos do racionalismo crítico e da filosofia analítica. Habermas conecta o interesse por emancipação com a psicanálise. Investe em Freud, no sentido de fazer da reflexão uma grandeza epistemológica, de comprometer o interesse com um conhecimento que seja eficaz em desmascarar estruturas repressivas, dissolvendo-as no fluxo emancipatório do saber. Encontra na psicanálise ingredientes humanistas como a espontaneidade, a consciência e a liberdade.
Habermas afirma que na situação terapêutica os indivíduos conversam entre si, sendo que o saber que resulta desta comunicação se localiza entre as coordenadas do próprio verbo que se articula. Não há um acordo preliminar, logo acontece em prática o que a reflexão filosófica só consegue antecipar teoricamente: o exercício emancipatório da comunicação. Para Habermas a psicanálise é “o único exemplo disponível de uma ciência que reivindica metodologicamente o exercício auto-reflexivo”[3]. Busca universalizar a situação terapêutica, tendo na emancipação seu interesse determinante. Situa a metapsicologia freudiana a serviço do interesse emancipatório. A conversa psicanalítica conduz à emancipação.
Interpreta a obra de Freud, buscando examinar o processo da dissolução da teoria do conhecimento, substituída pela teoria da ciência, galgando a esquecida experiência da reflexão. Diz que “Freud elaborou uma moldura interpretativa para processos de formação, perturbados e obliterados, os quais podem, através de uma reflexão de orientação terapêutica, ser conduzidos para vias normais”[4]. A auto-reflexão é “percepção sensível e emancipação, compreensão imperativa e libertação da dependência dogmática numa mesma experiência”[5]. O dogmático é coisificado pelo objeto, levando uma existência não livre, sendo o dogmatismo uma incapacidade teórica. Cita o conceito da auto-reflexão, desenvolvido por Fichte, como uma atividade que retroage sobre si mesmo, possuindo uma significação sistemática para a categoria do interesse que orienta o conhecimento.
Habermas denomina de interesses “as orientações básicas que aderem a certas condições fundamentais da reprodução e da autoconstituição possíveis da espécie humana: trabalho e interação“[6]. Estas orientações fundamentais visam a solução de problemas sistêmicos propriamente ditos. Trabalho e interação englobam processos de aprendizagem e de compreensão recíproca. Um complexo vital é um conjunto de interesses.
As ações emancipatórias são ações que coincidem com a atividade da reflexão. Um ato de auto-reflexão, que altera a vida, é um movimento de emancipação, sendo que para Fichte, conhecimento e interesse se fundem num único ato. Habermas diz que “aquilo que chamamos de razão se apreende no momento em que ela, enquanto tal, se executa como auto-reflexão”[7].
                       Segundo Habermas, a psicanálise ao nascer já se move no elemento da auto-reflexão, sendo a crítica psicanalítica do sentido em Freud um exemplo da auto-reflexão como ciência. Freud refletiu sobre as novas premissas da psicanálise, pois desenvolveu uma nova disciplina. Habermas afirma que “a psicanálise é, para nós, relevante como o único exemplo disponível de uma ciência que reivindica metodicamente o exercício auto-reflexivo”[8]. A crítica psicanalítica restabelece o texto mutilado na história do sujeito. O trabalho crítico da psicanálise implica em esclarecer o sentido da corrupção no texto adulterado por influências internas, um sentido que o sujeito não tem mais acesso. É uma hermenêutica, segundo Habermas, que “unifica a análise da linguagem com a pesquisa psicológica dos complexos causais”[9].
                       Prossegue:
Instruído pelo analista, o paciente aprende a ler seus próprios textos, por ele mesmo mutilados e deformados, e a traduzir, no discurso da comunicação pública, os símbolos de um discurso disforme na linguagem privada. Tal tradução descerra para a memória, até aí bloqueada, as fases geneticamente importantes da história da vida, e torna o sujeito consciente do seu processo formativo: neste sentido a hermenêutica psicanalítica não objetiva, como a hermenêutica das ciências do espírito, a compreensão de complexos simbólicos enquanto tais; o ato de compreender, ao qual ela conduz, é auto-reflexão [10].

                        Habermas parte da tese “segundo a qual o processo cognitivo do paciente, iniciado pelo médico, deve ser compreendido como uma auto-reflexão”[11]. O conhecimento psicanalítico faz parte da auto-reflexão, sendo que a técnica analítica não pode ser determinada sem a referência à experiência de reflexão. A tradução do texto psicanalítico, tornar o inconsciente consciente, seria a reflexão onde as repressões podem ser suprimidas. O analista encaminha o processo do esclarecimento, reorientando a dinâmica do recalque, e libertando as impressões recalcadas. Considera o saber psicanalítico como uma crítica: “O saber analítico, enquanto auto-reflexão, é crítica no sentido de que a intelecção do paciente possui, nela mesma, o poder analítico de remover atitudes dogmáticas”[12]. A crítica parte da necessidade de uma transformação. O paciente deseja se ver liberto de seus sintomas. A auto-reflexão se mantém em processo através do interesse pelo auto-conhecimento.
                        O tratamento psicanalítico através da dinâmica da reflexão transforma um estado em outro, a crítica caracteriza-se por um esforço emancipatório, transforma o estado patológico em linguagem reconciliada, e Habermas diz: “Enquanto a teoria permanecer, de acordo com o seu sentido, relacionada com a reconstrução de uma parte perdida da biografia e, assim, presa à auto-reflexão, sua aplicação será necessariamente prática”[13]
                        Segundo Habermas, a psicanálise deve a sua existência a intenção do esclarecimento. A crítica possui o sentido de análise. A crítica busca fazer com que o inconsciente se torne consciente, alterando também os elementos determinantes de uma falsa consciência. Numa perspectiva crítica é preciso recuperar a interação humana, baseada no agir comunicativo entre sujeitos livres, buscando o caráter emancipador em relação à dominação técnica. A crítica, ao explicitar as condições da ação comunicativa, permite o desmascaramento da ideologia e a retomada da razão emancipadora. Busca, aproximando-se da filosofia analítica, uma linguagem livre de distorção como fundamento de uma nova racionalidade. A psicanálise sempre combateu superstições, dogmas, seguindo o viés do Iluminismo, defende a racionalidade crítica, a liberdade humana; a teoria e a prática psicanalítica fazem parte do processo de emancipação da espécie humana. 

Referência bibliográfica:
Habermas, J. Conhecimento e interesse. Rio de Janeiro: Guanabara, 1987.

Notas:
[1] Habermas, J.. Conhecimento e interesse, Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1987. 
[2] Ibid., p.12 
[3] Ibid., p.19 
[4] Ibid., p.210
[5] Ibid., p.228
[6] Ibid., p.217 
[7] Ibid., p.232 
[8] Ibid., p.233 
[9] Ibid., p.236 
[10] Ibid., p.246 
[11] Ibid., p.250
[12] Ibid., p.251 
[13] Ibid., p.263

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

O funâmbulo, o gozo, o além...


                                            O funâmbulo, o gozo, o além...

                                                                                 Rosa Jeni Matz

Nietzsche apresenta o funâmbulo no Prólogo de sua obra Assim falou Zaratustra (Nietzsche 2006). O funâmbulo é um bailarino sobre uma corda, que se equilibra em grande altitude, homem que tenta sobreviver numa profissão de risco, dançando sobre a corda lançada pela “altitude” da metafísica.
O percurso do homem da atualidade reativa o caminho percorrido pelo funâmbulo de Nietzsche. O funâmbulo atual, preso aos valores dominantes, midiáticos, religiosos e econômicos, percorre uma trilha de difícil passagem, tentando se equilibrar numa situação-limite, situação sem nome, experiência que clama por uma palavra. Durante o caminhar do funâmbulo de Nietzsche surge o palhaço, que “passa por cima” do obstáculo, sendo o espírito da gravidade, representante do niilismo. Salta sobre o funâmbulo, que “cai da cena”, perde o equilíbrio, onde tentava sustentar a sua fantasia. Ao alcançar o chão, o funâmbulo se despedaça. Morre nos braços de Zaratustra.
O sujeito enfrenta desafios no novo milênio. Segue, buscando a possibilidade de cortar o além do gozo. Travessia do campo do gozo e a segunda morte.

O funâmbulo de Nietzsche
Após dez anos vivendo sobre a montanha, Zaratustra levanta com a aurora de uma manhã, e decide descer ao encontro dos homens, já que transbordava de sabedoria. Zaratustra, gozo do saber? Mas, a quem falar? Para todos e para ninguém, os universais, pois ao chegar à cidade mais próxima não encontra ouvidos para escutarem a sua grande “nova”, que parte da premissa “Deus morreu”, trazendo para o homem o ensino super-homem, “o homem é algo que deve ser superado”, “o super-homem é o sentido da terra” (Nietzsche 2006, 36). Gozo do homem, sentido da terra. “Sentido da terra” não como fim estabelecido pela metafísica, mas como uma meta, um fito, um destino, onde o homem se torna responsável pela sua vida aqui na terra, onde inventa e cria, alcançando um mar que faz submergir o desprezo do homem. O funâmbulo, após ouvir o discurso de Zaratustra na praça, julga que o discurso se referia a ele, e prepara-se para o trabalho a fazer. Mas, Zaratustra ainda diz ao povo: “O homem é uma corda estendida entre o animal e o super-homem – uma corda sobre um abismo” (Nietzsche, 2006, 38). Há o perigo ao transpor o abismo, de vacilar, olhar para trás. O povo ri de Zaratustra, que não é compreendido, representando já este povo o último homem, que interpreta “Deus está morto” como imoralidade, trazendo o tempo do mais desprezível dos homens, tempo que o próprio homem se despreza, este homem que inventou a felicidade, embora piscando o olho.
Então, o funâmbulo sai de uma pequena porta e caminha na corda, que se entende entre duas torres, suspensa sobre o povo. Na metade do seu caminho surge da pequena porta um palhaço, pulando rapidamente atrás do funâmbulo e o pressiona, até que pula por cima dele, soltando um grito diabólico. O funâmbulo assusta-se, cai no vazio, percebendo o triunfo do rival. Cai gravemente ferido, com ossos partidos, mas vivo. Zaratustra se aproxima dele. O funâmbulo diz que desde muito sabia que o Diabo o alcançaria, sendo que Zaratustra retruca negando a existência do Diabo e do inferno (nem o Mal, mas também nem o Bem).
Zaratustra não despreza o funâmbulo, pois este faz do perigo o seu trabalho, e deseja sepultar-lhe com as suas mãos. À noite, Zaratustra parte com o companheiro cadáver, carregando-o às costas, e após alguns desencontros e fome, chega à floresta, adormece, e ao acordar uma nova luz raiava em si, anunciando que precisava de companheiros vivos, para quem possa falar, e não de rebanho, de multidão, de mortos. O seu primeiro companheiro, o funâmbulo, um cadáver, fica enterrado numa árvore oca, protegido contra os lobos. Zaratustra não quer mais se dirigir aos mortos, quer se unir aos criadores, afirmar a vida. Quer afastar o demônio do niilismo, “a causa pela qual todas as coisas caem” (Nietzsche, 2006, 67), o espírito de gravidade. 
O funâmbulo assusta-se, deixa-se se desequilibrar pela arrogância do palhaço, representação remanescente do gênio maligno de Descartes, sendo maligna esta face do mal, que se refere à outra face, a de Deus, apontando para a dualidade Bem e Mal. Metafísica dualista do Bem e do Mal. Nietzsche busca com Zaratustra o para além, o para além do Bem e do Mal, não permanecendo mais na dualidade cartesiana, mente e corpo, e sim, como expressa no discurso Dos desprezadores do corpo “a alma é somente uma palavra para alguma coisa no corpo” (Nietzsche 2006, 60). O para além do Bem e do Mal é uma filosofia que diz: “Eu sou todo corpo e nada além disso” (Nietzsche 2006, 60).

O sentido da Terra como gozo
Hoje, o homem vive situações-limite, sendo muitos os funâmbulos. Estamos em outro milênio, mas observamos como o pensamento de Nietzsche através da fala de Zaratustra, é vigoroso. O espírito religioso impera, a globalização apaga as fronteiras. Muitos querem alcançar novos territórios, mas não conseguem transpor suas próprias fronteiras, barreiras, preconceitos, que contêm antigos valores. Estes homens não aprenderam o sentido da terra.
Para muitos, com o avanço da tecnologia, da mídia, a Terra se tornou achatada! Um disco chato! Lacan tentou apreender o Real pela topologia. Considera importante um analista saber usar uma tesoura. Através do cross-cap (gorro cruzado) mostra a relação do sujeito com o objeto, a fantasia, que o sustenta como sujeito desejante. Após um corte topológico no cross-cap surge uma faixa de Moebius, que representa o sujeito, e um disco chato, o objeto a. O sujeito dividido pelo corte, pela linguagem, está encoberto, sofrendo o eclipse da Terra. A Terra, para a tecnologia, é um objeto chato, e como objeto a, é um campo de gozo. O corpo é lugar de gozo, a Terra se torna campo de gozo. O homem está achatado, monótono, o objeto a cobrindo a sua falta, a sua castração. O solo e o homem se “intergozam”. E, ao se identificar imaginariamente com a Terra achatada, o homem se tornou chato, monótono, coisa.
Fomos levados a copiar modelos imperiosos, apontando para a ausência de identificações simbólicas. O homem retorna ao primado da consciência, à mimesis da consciência, às identificações imaginárias (aÛa’), e o significante Nome-do-Pai se torna obscuro. O simbólico torna-se sombra. Como Heidegger afirmava, o ente escondeu o Ser.

O funâmbulo e o campo entre as duas mortes
O funâmbulo da atualidade tenta atravessar abalado uma corda. Parte de um ponto para atingir um outro ponto. De que ponto ele parte? Para qual ponto ele segue? O homem atual está atravessando o campo das duas mortes descritas por Sade, e apresentadas por Lacan em A ética da Psicanálise (Lacan 1991). Lacan afirma que a segunda morte é evocada pelos heróis de Sade como “o ponto onde o próprio ciclo das transformações naturais se aniquila” (Lacan 1991, 301). Não há mais resto vivo, pois a vida não continua. Sade diz a respeito da Natureza e do crime: “Seria preciso, para ainda melhor servi-la, poder opor-se à regeneração resultante do cadáver que enterramos. O assassinato só tira a primeira vida ao indivíduo que abatemos; seria preciso poder arrancar-lhe a segunda, para ser ainda mais útil à natureza, pois ela quer o aniquilamento: está fora de nosso alcance dar aos nossos assassinatos a extensão que ela deseja” (Lacan 1991, 258).
Lacan articula que surge no enunciado de Sade o ponto de cisão entre o princípio de Nirvana ou de aniquilamento (retorno a um estado de repouso absoluto) e a pulsão de morte. A pulsão de morte se situa num âmbito histórico, na dimensão do que é memorável no sentido freudiano, registrado na cadeia significante, e se articula num nível só definível em função da cadeia significante, numa referência de ordem em relação ao funcionamento da natureza.
Lacan em Kant com Sade diz que a segunda morte “reduplica o desvanecimento do sujeito: do qual ele faz um símbolo, no anseio de que os elementos decompostos de nosso corpo, para não voltarem a se reunir, sejam, eles mesmos aniquilados” (Lacan 1998, 788).
Podemos pensar a segunda morte, morte simbólica, como o tempo do Instante: travessia do homem do estado de natureza à entrada na cultura, pelo acesso à Linguagem. Em Totem e Tabu (Freud 1974) Freud narra esta passagem pelo fim da horda patriarcal, que era constituída por um pai violento e ciumento, que guardava todas as fêmeas para si, e expulsou os filhos na medida que cresciam. Certo dia os irmãos retornaram, mataram e devoraram o pai (refeição totêmica), efetivando a identificação com ele, adquirindo cada um dos irmãos parte de sua força. A refeição totêmica é a “comemoração desse ato memorável e criminoso, que foi o começo de tantas coisas: da organização social, das restrições morais e da religião” (Freud 1974, 170).
Estamos num momento histórico em que observamos a queda da palavra, da linguagem, não ocorrendo espaço para o corte do Simbólico. A segunda morte, neste momento, encontra obstáculos para se efetivar. A fim de que o simbólico possa cunhar o indivíduo é necessária a transformação do estado de barbárie. O falo, significante do desejo, funciona como medida, razão, limite, operador de cunhagem da linguagem, estando velado. Como significado na operação da Metáfora Paterna, o falo aguarda a possibilidade de emergência do Nome-do-Pai, para que este possa apontar onde está o desejo na atualidade.
Pensemos a pulsão de morte. A pulsão é um conceito psicanalítico essencialmente fronteiriço. Uma linha de encontro ou “desencontro” entre o somático e psíquico. Nos termos de Freud Trieb é um “conceito situado na fronteira entre o mental e o somático, como o representante psíquico dos estímulos que se originam dentro do organismo e alcançam a mente, como uma medida de exigência feita à mente no sentido de trabalhar em conseqüência de sua ligação com o corpo” (Freud 1974, 142). Mente e corpo ligados. Sobre o mistério da ligação do corpo e da mente, Freud busca decifrá-lo através da pulsão, enquanto que Descartes atribui este ponto de ligação à glândula pineal.
O Jornal O Globo diz: “A Terra atravessa uma onda de extinção sem precedentes desde o fim dos dinossauros, segundo a ONU. A cada hora desaparecem três espécies de plantas ou de animais; por dia, 150 são extintas. A culpa da perda global de biodiversidade é da Humanidade. Destruição de habitats, caça e aquecimento global estão entre as principais causas” (O Globo 2007). O homem gozou da Terra. Lucrou do seu produto. Agora, ocorre a extinção deste produto. Mas, como na dialética do senhor e do escravo enunciada por Hegel, surge neste momento o alerta, como mediação, que ativa a mudança de posição na dialética da consciência humana. Esta notícia vai de encontro ao pensamento de Lacan sobre o ponto de cisão entre o princípio de Nirvana, ou de aniquilamento, e a pulsão de morte. O princípio de Nirvana aponta para o ponto de um gozo absoluto. Enquanto a pulsão de morte clama por uma simbolização, mesmo impossível, da morte.
Em Freud, a partir de 1920, o princípio de Nirvana surge como uma tendência radical para conduzir a excitação ao nível zero, referência ao princípio de inércia, buscando evitar qualquer fonte de excitação, o que leva o prazer ao aniquilamento. A pulsão de morte se apresenta como uma erótica fundante, como o eterno retorno da fundação e constituição traumática do sujeito. A experiência traumática, concomitantemente ao transbordamento pulsional, gera excesso contínuo de pulsão, sendo que o psiquismo persegue um domínio impossível, já que a descarga total é a meta final. A pulsão de morte se torna reduto indomável da pulsão, tendência do ser vivo a retornar ao “inorgânico”. Assim, ao lado do princípio do prazer surge um outro princípio, a compulsão à repetição, que funciona como um “eterno retorno” do mesmo, retorno a um ponto de partida, de constituição traumática do sujeito, relacionado à perda primordial. A pulsão de morte, em seu movimento em volta do objeto, objeto perdido em busca do tempo perdido da nomeação, anuncia esta tendência de volta ao inanimado como algo impossível, já que não é natural, tendo o trauma como ponto de partida da trilha inconsciente do sujeito. A ilusão de unidade é rompida.

O eterno retorno do mesmo

                      O eterno retorno é o pensamento mais arrebatador de Nietzsche. O devir do mundo transcorre para frente e para trás no tempo infinito. Como algo finito, o devir volta-se ao mesmo tempo sobre si, sendo o devir do mundo constante, eterno. Este devir do mundo como devir finito acontece num tempo infinito, não cessando após o esgotamento de suas possibilidades finitas, precisando se repetir no futuro como um devir constante. A totalidade do mundo é finita nas figuras do devir, logo as possibilidades de variação de seu caráter conjunto são finitas, assim o processo do devir atrai para si tudo o que passou, impelindo a mesma série para frente de si, implicando que todo o processo do devir traz a si mesmo de volta, retornando como os mesmos. “O eterno retorno da totalidade do devir do mundo precisa ser um retorno do mesmo” (Heidegger 2007, 285-286).
Nietzsche apresenta o pensamento do eterno retorno pela primeira vez em A Gaia Ciência (Nietzsche 2001) no aforismo 341: “O maior dos pesos” (O peso mais pesado). É o pensamento da repetição do mesmo, da vida como é e foi, onde o indivíduo pode amaldiçoar “o demônio” que comunica este dizer, ou então, viver um instante imenso, incorporando este pensamento como “o maior dos pesos”, pensamento que o transforma, pois pesa sobre os seus atos.
Ao pensar este pensamento mais pesado Nietzsche diz no aforismo 342 que “a tragédia começa” (Incipit trageodia) através do declínio de Zaratustra. Heidegger afirma que pelo pensamento do eterno retorno do mesmo o trágico se torna caráter fundamental do ente. Nietzsche se coloca contra a interpretação aristotélica de encontrar o trágico em dois afetos depressivos: o pavor (medo) e a compaixão. Zaratustra é um espírito heróico, pois vai ao encontro de seu mais elevado sofrimento pelo seu declínio, trazendo a mais elevada esperança. Ele é o mestre do “super-homem” (além-do-homem). Como diz Heidegger, Zaratustra é o primeiro pensador do “pensamento dos pensamentos”. Para Heidegger esta é a sua essência: o pensador propriamente dito do pensamento do eterno retorno do mesmo (Heidegger 2007, 218). 
Em Assim falou Zaratustra (Nietzsche 2006) Nietzsche insere o espírito trágico no interior do ente. Zaratustra é o pensador trágico, afirma o “sim” mais elevado ao “não” mais elevado. No capítulo “Da visão e do enigma”, Parte III, um enigma surge diante de Zaratustra a ser decifrado, impelindo um salto. Zaratustra narra aos marujos a sua ascensão por uma senda da montanha.  E, por este caminho surge o anão, “espírito do peso” que precisa ser superado. Mas, mesmo puxando para baixo, o espírito da gravidade, o anão, ameaça do niilismo que paralisa, não suporta o pensamento abissal de Zaratustra. Para Heidegger a profundidade cresce nesta ascensão, “o abismo torna-se pela primeira vez abismo... ele ganha as alturas” (Heidegger 2007, 227). Ao pensar o abismo Zaratustra vence o anão: “Alto lá, anão!”, falei. “Ou eu ou tu! Mas eu sou mais forte dos dois; - tu não conheces o meu pensamento abismal!” (Nietzsche 2006, 193).  Zaratustra se vê diante de um portal. O portal “Instante”, que traz a imagem do tempo que corre para trás e para frente até a eternidade. Heidegger diz que o tempo é percebido a partir do “instante”, do “agora”, e “o todo diz: o pensamento do eterno retorno do mesmo é articulado agora com o âmbito do tempo e da eternidade” (Heidegger 2007, 227). O portal é a visão, e a partir daí começa a marcha da decifração.
Este ponto do “instante”, que inclui a eternidade, é momento mítico em Freud, pela fundação do sujeito no mito da horda primitiva, através de sua inserção no campo da linguagem. O instante e a eternidade, tempo da busca incessante do objeto perdido.

Antígona e a segunda morte
O trágico é a repetição do mesmo. Em Antígona, tragédia de Sófocles, observamos a repetição do tema do desejo incestuoso em sua origem, dado pela diretriz do destino trágico de seu pai Édipo, que se repete na sua relação com o irmão Polinices, que Antígona deseja “enterrar”. Não aceita a exclusão do sujeito do desejo, buscando num campo “entre duas mortes” encontrar o sentido do limite da segunda morte, ao nomear a morte do seu irmão, como também a sua própria morte. Tentativa impossível de encontro do objeto para sempre perdido, incessante busca para simbolizar a perda deste objeto, pelo movimento de presença/ausência. Ao ser condenada a ser enterrada viva, Antígona sofre uma morte antecipada, morte que invade a vida, e vida invadindo a morte. Pontos de vida e de morte sem limites especificados. Zona que se abre na terra, um abismo. Até, atas, termo que “designa o limite que a vida humana não poderia transpor por muito tempo” (Lacan 1991, 318). A aliança incestuosa vincula Antígona a seu pai e a seu irmão, o seu Até, desgraça e loucura. Para além da Até se passa um tempo curto. Antígona não suporta mais viver, “sua vida não vale a pena ser vivida” (Lacan 1991, 318), não aceita se submeter à “lei” de Creonte, lei sem laço com o desejo. É uma heroína na posição de “na-finda-linha”, zona limite entre a vida e a morte. Antígona caminha em direção à segunda morte, morte simbólica. Insiste na simbolização do cadáver de seu irmão.
Podemos saltar de Antígona para a tragédia urbana. As balas perdidas em nossas cidades apontam para uma situação-limite entre duas mortes. Balas partem de armas sem alvos determinados, atingindo a população urbana inesperadamente. Morte arrombando vidas, e vidas trancadas em casa invadidas pela morte. Esta é a zona do abismo em que vivemos atualmente. Estas balas são objetos a, balas sem rumos, objetos errantes, sem alvo.
As crianças abandonadas em nossas ruas são “restos errantes” que vendem “balas”. Crianças, que embora amamentadas durante muitos meses por suas mães, como assinala Françoise Dolto, depois são entregues à mãe natureza, que mantém a sobrevivência delas, através de alimentos encontrados no lixo, mas que perverte o sentido afirmativo “do seio-vida” (Dolto 1998, 79).
A pulsão de morte contorna o objeto para sempre perdido, denunciando, ao mesmo tempo, o seu desaparecimento, a primeira morte, como também tenta estabelecer um horizonte, o da segunda morte. O movimento é constante e insistente, busca de simbolização, transformando a Coisa, lugar de gozo incestuoso, num resíduo, o desejo, resultado da subtração da necessidade em relação à demanda.

Além do gozo
Caminhamos para o além do gozo.
O princípio de Nirvana, o aniquilamento, ameaça atualmente. A ausência do simbólico faz emergir o aquém da pulsão de morte. O homem gozou da Terra. Explorou a Terra, etapa em travessia. Agora, percebe os danos e os ganhos deste gozo. Há um excesso de gozo. Este excesso no devir do gozo caminha para o surgimento de uma outra configuração do devir na existência humana. A voz do eterno retorno do mesmo clama pelo limite. Os movimentos ecologistas clamam pela pulsão de vida da Terra.
Este espaço–tempo além do gozo se apresenta para ser pensado por nós, os psicanalistas. O território se abala. O Real é o impossível, o inapreensível, o indizível, o impensável. Não cessa de não se escrever. Hoje, está se abrindo uma nova fenda no Real, e através do pensamento abissal o corte pode ser efetuado.
O mal-estar contemporâneo, em alguns casos, aparece na clínica através de pacientes que sofrem do gozo do Outro, sujeitos divididos, alvos dos perversos, que reivindicam a posição efetiva de sujeito, onde se possa falar uma fala plena. O setting analítico se torna lugar para o desejo. A fala vazia impera em nossa cultura. O sujeito do enunciado ganha espaço, sendo que o sujeito da enunciação, do desejo, fica exprimido, dando lugar à angústia e produções psicossomáticas. O desamparo não é só familiar, mas da Terra. O inconsciente tem se manifestado na cultura recente por vivências que apontam para o registro do Real, carecendo da dimensão Simbólica. Logo, inconsciente de difícil acesso. Inconsciente, a meu ver, errante, perto de alguma nova fronteira, como extensão de um saber. Como psicanalistas precisamos pescá-lo, buscá-lo em outras terras, seguir trilhas inexploradas, para que no futuro possamos afirmar: “Resistimos” à banalidade da palavra.
A psicanálise tem função de ato, de corte na contemporaneidade, propondo uma teoria e práxis de “resistência” à banalidade da palavra, pretendendo manter o solo fecundo e vivo no planeta Terra, semeando o desejo que se conecta à lei, para que possa florescer, acontecer um feliz encontro do homem com a Terra. 

                       Bibliografia

Dolto, Françoise 1998: Solidão. Trad. I. Benedetti. Martins Fontes, São Paulo.
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