sexta-feira, 4 de abril de 2014

A ética do desejo

A ética do desejo
                                  Rosa Jeni Matz

            A ética em psicanálise traz a questão da responsabilidade do sujeito pelo seu desejo.

        Em Totem e Tabu, mito da horda primeva, Freud elabora a fundação da cultura através do ato criminoso do assassinato do pai da horda, e do devoramento deste pai despótico pelos filhos. No lugar de uma lei tirânica, onipotente do pai, surge um acordo entre os irmãos culpados, criando-se a lei simbólica, à qual todos estão assujeitados. Esta lei se refere ao pai morto, constituindo a dívida simbólica. Portanto, a lei e o desejo se enlaçam num liame trágico. O desejo incestuoso é barrado pela lei, tornando-se falta, falta a ser. O desejo é o movimento de busca de reencontro do objeto perdido, mas como o objeto é para sempre perdido, o encontro é faltoso. A lei estrutura o desejo humano, impedindo a realização do incesto. A ética do desejo é uma ética de responsabilidade, implicando que o sujeito não ceda de seu desejo frente ao gozo, desejo que o humaniza, o essencializa, tornando-o humano, protegendo-o do gozo, que seria um excesso, ultrapassagem da barreira da lei.

        Enquanto que para Aristóteles a eudaimonia poderia ser atingida pelo conhecimento do Bem, para a psicanálise este Bem (das Ding) se perdeu. A felicidade (bonheur) seria uma questão de sorte, numa boa hora o sujeito pode ter um bom encontro com o real. Mas, o sujeito teve um trágico encontro com o real. O trauma é este trágico encontro, encontro marcado.
        A sublimação seria a possibilidade que a civilização oferece de manifestação de alguma coisa diferente da sintomatologia do mal-estar. Das Ding, a Coisa, nunca é possuída ou representada, é sempre perdida e repetida em nossas vidas. Lacan define a sublimação como “a elevação de um objeto à dignidade da Coisa”. A sublimação não representa essa Coisa perdida, ela recria o vazio (vide) deixado por essa perda, estruturalmente irrepresentável para o sujeito. Mediante a recriação a perda do objeto descobriria outro destino diferente da angústia, da neurose.


 Bibliografia
 França, M.I. Psicanálise, estética e ética do desejo. São Paulo: Perspectiva, 1997.
 Lacan, J. A ética da psicanálise. RJ: Jorge Zahar, 1988.
 Rajchman, J. Eros e verdade: Lacan, Foucault e a questão da ética. RJ: Jorge Zahar, 1993.


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