sábado, 11 de agosto de 2018

Ética contemporânea


Ética contemporânea

Desenvolvo abaixo em poucas linhas o raciocínio que parte do texto de Freud sobre o masoquismo; algumas palavras sobre a ética em Freud e Lacan; e a argumentação lógica de Lacan sobre as fórmulas da sexuação, que chega ao axioma A mulher não existe, axioma que parte de uma lógica simbólica. Chego à conclusão de que a Ética não existe, mas podemos considerar éticas no plural atualmente.

Em O problema econômico do masoquismo (1924) Freud afirma:
“O complexo de Édipo mostra assim ser – como já foi conjecturado num sentido histórico– a fonte de nosso senso ético individual, de nossa moralidade. O curso do desenvolvimento da infância conduz a um desligamento sempre crescente dos pais e a significação pessoal desses para o superego retrocede para o segundo plano. Às imagos que deixam lá atrás estão, pois, vinculadas as influências de professores e autoridades, modelos auto escolhidos e heróis publicamente reconhecidos, cujas figuras não mais precisam ser introjetadas por um ego que se tornou resistente (grifo meu).
A primeira renúncia instintual é forçada por poderes externos, e somente isso cria o senso ético, que se expressa na consciência e exige uma ulterior renúncia ao instinto.”

Em Totem e Tabu, mito da horda primeva, Freud elabora a fundação da cultura através do ato criminoso do assassinato do pai da horda, e do devoramento deste pai despótico pelos filhos. No lugar de uma lei tirânica, onipotente do pai, surge um acordo entre os irmãos culpados, criando-se a lei simbólica, à qual todos estão assujeitados. Esta lei se refere ao pai morto, constituindo a dívida simbólica. Portanto, a lei e o desejo se enlaçam num liame trágico. O desejo incestuoso é barrado pela lei, tornando-se falta, falta a ser. O desejo é o movimento de busca de reencontro do objeto perdido, mas como o objeto é para sempre perdido, o encontro é faltoso. A lei estrutura o desejo humano, impedindo a realização do incesto. A ética do desejo é uma ética de responsabilidade, implicando que o sujeito não ceda de seu desejo frente ao gozo, desejo que o humaniza, o essencializa, tornando-o humano, protegendo-o do gozo, que seria um excesso, ultrapassagem da barreira da lei.
Nas fórmulas da sexuação, Lacan afirma que todos os homens estão submetidos à função fálica, à castração; existindo ao menos um homem que não obedece à função fálica já que é exceção à castração. Assim, podemos falar de um conjunto universal a propósito dos homens. Lacan também significa o mito da horda primitiva de Freud.
Já no modo de inscrição das mulheres na fórmula da sexuação nenhuma delas expressa a universalidade. Não todas as mulheres estão inscritas na função fálica, como também não existe uma mulher no lugar da exceção à castração. Assim as mulheres não constituem um conjunto universal sob a perspectiva fálica. Não existe uma expressão geral lógica para legitimar a mulher. Assim Lacan conclui que “a mulher não existe”.
Hoje devido à queda do Simbólico, do lugar da lei como exceção, que em Freud é internalizada pelo sujeito, fornecendo o senso ético, podemos afirmar que “a Ética não existe”, pois a lei é o lugar da exceção, e este conjunto universal que fornece a consistência ao sistema está em declínio na contemporaneidade.
A ética em Lacan é uma ética do bem-dizer, de escutar do inconsciente a palavra plena, constituindo o sujeito do desejo e da enunciação. Vivemos um momento de fake news. Das mortes traumáticas como irrupção do Real da pulsão de morte que não são esclarecidas, como também de fatos traumáticos, de verdades veladas, emergem mentiras que tentam como compulsão de gozo cobrir o real. 
Mas, será assim mesmo? A ética não existe?
Vivemos no tempo da Ética não existe, mas éticas existem (no plural). Mundo de pequenas leis, de grupos com desejos singulares. Cada grupo organiza o que é permitido, o que é proibido, o limite de cada membro. As éticas não se cruzam, não se encontram. A Ética não existe!


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